“O trabalho espiritual não se assemelha a nenhum outro trabalho, é algo que toca naquilo que cada ser tem de mais profundo, de mais íntimo. Há que fazê-lo, mas sem dizer aquilo que se faz. Todos os que se põem a falar dos exercícios que fazem, do modo como meditam, etc., e dos resultados que obtêm são seres inconscientes que não sabem o que vão perder. Falar do seu trabalho espiritual significa que não se compreendeu nem as suas características nem as suas exigências.

Aconselho-vos, pois, a manter segredo sobre tudo aquilo que fazeis para vos aproximardes do ideal de luz, de beleza, a que aspirais. Mantendo esse trabalho secreto, mantendes também em vós o impulso, o ardor, o entusiasmo, de que necessitais para progredir. E podeis estar certos de que, se perseverardes, se os vossos esforços forem verdadeiramente sinceros, mais cedo ou mais tarde isso transparecerá: todos sentirão a vida do espírito manifestar-se através de vós.”

 
“A condição para o verdadeiro sucesso não está no esforço violento e espetacular de um instante, mas na repetição quotidiana de pequenos esforços. A água que cai gota a gota sobre a pedra acaba por fazer nela um buraco, apesar de a gota de água ser tão mole e a pedra tão dura!

Não deixeis passar um só dia sem fazer esforços, pois o segredo do sucesso está na continuidade, na perseverança. Se parais, correis o risco de perder tudo o que adquiristes, pois a matéria tem um grande poder de resistência e tem sempre tendência para voltar à sua inércia primitiva. Deveis trabalhar incessantemente para a elevar, para a reter no nível a que vós mesmos desejais elevar-vos para nele fazerdes a vossa morada.”

 
“O nosso Ensinamento pode ser resumido numa só palavra: criação. Sim, criar, mas criar o quê? Quadros? Estátuas? Trabalhar sobre telas, madeira, mármore? Não, trabalhar sobre si mesmo, pois é essa a verdadeira matéria-prima: o próprio ser, a sua própria matéria. Um escultor fez algumas estátuas; muito bem, mas, quando observais a sua atitude, o seu rosto, vedes que ele nunca tentou esculpir-se a si próprio, não passa ainda de uma matéria bruta.

Muitas pessoas mostrar-vos-ão os seus quadrozinhos, as suas cançonetas, os seus poemas, que só refletem a sua desordem interior. Já basta de todos esses artistas! Onde estão os artistas verdadeiros, prontos a começar o verdadeiro trabalho, a moldar-se a si próprios interiormente? É um trabalho desconhecido, inédito, mas é o trabalho do futuro.”

 
“Dir-lhe-ei que o mais importante não é trabalharem sobre a tela ou a madeira, ou com os sons e as cores… mas trabalharem sobre si próprios. Porque é essa a verdadeira matéria prima: vocês próprios. Os artistas criam, numa matéria exterior a eles, obras exteriores a eles; e como é sobre esta matéria exterior que concentram os seus esforços, ainda que produzam obras-primas – sinfonias, poemas, quadros, monumentos –, quando estamos com eles verificamos que não são tão magníficos como isso. Muitas vezes, ficamos siderados: as suas atitudes são desprovidas de tudo o que faz a beleza das suas criações; não têm equilíbrio, nem harmonia, nem poesia.

Pois bem, eu digo-vos que o verdadeiro artista é aquele que é capaz de se tomar a si mesmo como matéria para a sua criação. Todos os métodos da vida espiritual estão à sua disposição para o ajudar e o inspirar nesta tarefa. Trata-se de uma concepção da criação artística ainda inédita e desconhecida, mas é a que merece todo o vosso estudo, toda a vossa atenção. Sim, em primeiro lugar, é em vós que deveis criar a poesia e a música, formas e movimentos harmoniosos, cores cintilantes. Dir-me-eis: «Mas, ninguém verá nem ouvirá nada!» Evidentemente, ninguém verá nem ouvirá essa harmonia no sentido em que vêem e ouvem as formas de arte habituais, mas aqueles com quem vos relacionais senti-la-ão e ficarão maravilhados convosco.

Nada do que o homem cria interiormente permanece sem efeito, e, em primeiro lugar, para si próprio. Se, através dos vossos pensamentos, sentimentos e desejos, tentardes criar o paraíso em vós, sereis vós que, em primeiro lugar, nele ireis viver. E então, pouco a pouco, as pessoas ir-se-ão aproximando de vós, irão começando a sentir que por ali existem fontes que correm, aves que cantam, flores que perfumam o ar, e dirão umas às outras: «Conheceis aquele jardim? Que paz! Que pureza! Que bênção!»

Sim, o que conta é termos vontade de triunfar, é visarmos o cimo, o ponto mais elevado, o alto ideal, a fim de criarmos a verdadeira beleza, de a criarmos em nós e fora de nós. A idéia de criação é a quinta-essência do nosso Ensinamento.”

 
“Já tem acontecido, em momentos de desânimo, certos artistas (pintores, compositores, poetas, romancistas, dramaturgos) destruírem algumas das suas obras-primas. E é pena, porque eles prejudicaram-se a si mesmos e também privaram a humanidade de algo grandioso, belo. A razão para o seu ato foi o fato de eles estarem demasiado concentrados em si mesmos, nas suas dificuldades, nas suas angústias, nos seus tormentos. Não souberam sair do seu eu para se porem em contato com tudo o que há de bom e de belo nos humanos e na natureza. Só esta atitude poderia tê-los protegido, impedindo-os de virar a sua insatisfação contra a sua obra.

Tal como o artista, um espiritualista pode passar por períodos de desânimo, pois o seu caminho é difícil, e ele deve saber proteger-se. Como? Maravilhando-se com as obras de Deus, dos servidores de Deus. Graças a esta sensação exaltante, ele ultrapassa a frustração e até o desespero que as suas próprias imperfeições podem incutir nele.”

 
“A verdadeira poesia é a expressão do verbo divino, que é, simultaneamente, músicas, cores, formas, perfumes. Por isso, os seus poderes são imensos. Alguns dirão que a música é mais poderosa do que a poesia, pois ela toca directamente a sensibilidade dos auditores. Sim, mas a sua linguagem não é tão clara, portanto, não é tão educativa como a da poesia, pois é feita somente de sons, ao passo que um poema é composto de palavras, através das quais se percebe não só uma melodia, um ritmo, uma entoação, mas também cores, formas, uma arquitetura. E, sobretudo, descobre-se um sentido.

A música desperta o sentimento, estimula a vontade, mas não dá uma orientação clara. Pode-se ouvir música durante toda a vida e continuar tão incerto e ignorante como antes. Ao passo que, ao ler ou escutar a obra de um poeta verdadeiramente inspirado, graças às palavras descobre-se um sentido e, então, avança-se com clareza.”

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