por Sri Prem Baba, em Satsang de março de 2010.

Pergunta: Como viver espontaneamente presente no agora se há uma lei de causa e efeito? Ou seja, se minhas ações presentes determinam efeitos futuros, como viver a minha verdade se ela pode causar sofrimento no futuro? Como não temer?

Prem Baba: Claro, não há como viver espontaneamente estando completamente identificado com a mente. A espontaneidade não é um produto da mente. Temos que diferenciar espontaneidade de instintividade, ou ainda, a ação da reação. Você está sonhando com a liberdade. Você está imaginando a espontaneidade, mas você ainda não sabe o que é isso porque age a partir do medo. Você tem medo do resultado das suas atitudes. Por isso a necessidade de controlar cada passo. A sua vida é uma operação matemática. Você tem que saber exatamente o que cada ação vai proporcionar porque você precisa ter um futuro seguro. Então, você precisa fazer tudo absolutamente certo. Essa segurança que você busca não existe; esse controle está imobilizando os seus passos e está secando a sua criatividade; está estagnando todas as possibilidades de inovação e criações na sua vida.

Viver com a necessidade de que tudo dê absolutamente certo, seca a alegria de viver. A reação nasce do medo, a instintividade é um sistema de auto-proteção; é um mecanismo de sobrevivência. A espontaneidade é um fenômeno da alma. A ação nasce do coração e é sempre cheia de sabedoria e compaixão. Se ela nasce da presença é o mesmo que dizer que nasce da verdade porque a presença é a verdade e a verdade é Deus. Então, a ação correta é aquela realizada por Deus.

O que pode estar errado? O que é que você entende como errado? O errado são as reações que surgem a partir do medo. Você identificado com o corpo, precisando usar o instinto para se proteger. Tudo que é criado a partir do medo nós podemos chamar de construção erronia. O medo surge da sua identificação com o falso eu, com a imagem idealizada criada para agradar, para receber energia do outro. O erro é aquilo construído a partir da máscara e tudo aquilo que é construído a partir da máscara, em algum momento vai cair. Ontem mesmo eu recebi um email de um buscador espiritual que está na sua cidade e está querendo se suicidar porque ele foi vendo tudo o que ele acreditava ter realizado desaparecer da frente dele. Ele perdeu a mulher, os filhos se afastaram, perdeu o emprego, a fé, a esperança… Ele escreveu dizendo que ele ainda tinha um pouquinho de fé em mim e por isso estava me escrevendo. Esse momento chega para todos. Em algum momento na jornada evolutiva, as construções baseadas no medo e no erro devem desmoronar o que pode ser extremamente doloroso principalmente quando a pessoa acredita que o desmoronamento é devido a um erro pessoal. O subtexto é assim: “Eu estou dando o meu melhor, estou dando tudo que posso e tudo está sendo tirado das minhas mãos, tudo está desaparecendo”. A pessoa acredita que tudo está desaparecendo e que ela mesma causou isso. Eu não diria que é um erro pessoal, eu digo que é um aspecto da evolução da consciência humana. Durante o processo evolutivo, quando você está identificado com a máscara, com o erro, ou melhor, com a mente, você age a partir do medo. Essa construção, em algum momento, vai cair. Se você for honesto, irá perceber que isso que está indo embora não lhe dava satisfação, mas lhe dava uma idéia de segurança. “Isso eu controlo”. Pode estar um horror, uma tremenda escuridão, mas é a “minha escuridão”, é o “meu horror”, “eu controlo”.

Você tem medo de experienciar essa construção desabar, mas se você estiver compreendendo o que estou dizendo, você vai querer que a mentira desabe e vai querer que as construções baseadas no medo caiam. O que não quer dizer que não seja doloroso, mas se você já viu que não se trata de uma recaída, muito pelo contrário é a sua evolução que está permitindo esse desmoronamento, você dirá “seja bem-vindo”. Porque, para o novo surgir, o velho tem que desaparecer. Eu sei que o seu sofrimento é porque o velho está indo embora e o novo ainda não surgiu. Isso é porque você está sendo ensinado a confiar. Você está aprendendo a confiar na sabedoria da incerteza, a confiar na guiança do grande mistério. É somente daí que surge a verdadeira autoconfiança que é a real segurança. Se a segurança está baseada em alguma coisa que está fora é claro que ela não é a autêntica confiança. Em algum momento você vai ter que reconhecer essa segurança dentro de você, mesmo na relação com o mestre espiritual. Hoje eu sei que lhe dou segurança, mas em algum momento eu vou ter que dar um chute na sua bunda e deixá-lo caminhar sozinho. Senão você vai passar a vida inteira dependendo de algo que está fora e achando que encontrou a segurança. Esse segurança é ilusória.

Se você realmente vive espontaneamente, de forma natural e desprendida, suas ações estão cheias de sabedoria e compaixão. Você está trilhando o caminho do coração, o caminho da verdade. Você está criando um futuro iluminado, mas isso é outro assunto porque você não se preocupa com o futuro. Você pode visualizar o futuro até para se mover no plano horizontal. Eu sei que vou acabar o satsang e vou sair por esta porta para realizar alguns compromissos. Você sabe que um dia vai ter que voltar para casa. O poder de fazer planos para se mover também é sábio desde que você não se apegue a um desfecho determinado senão você se aprisiona no seu plano. Você não pode controlar o fluxo da vida. Deus tem seus mistérios e é exatamente ai que está a chance de você experienciar a alegria de viver. Porque uma vida completamente determinada e previsível acaba com o entusiasmo de qualquer um. Ontem nós estávamos falando sobre sexualidade. O que faz Eros ir para outra direção? Justamente a previsibilidade. “Eu estou cansado de comer a mesma comida, eu quero ir ao restaurante. Eu quero variar um pouco”. Você cansou do sabor dessa comida. Por quê? Porque você se acostumou a fazer sempre a mesma coisa, porque precisa de segurança. Você determina como as coisas devem ser para que tudo aconteça corretamente, mas na verdade você está trancando o mistério dentro do cofre. Ai acaba o senso de aventura. Viver espontaneamente é viver o momento, guiado pelo grande mistério, é possível que você seja convidado a ir para uma outra direção. Se você estiver realmente presente, você vai saber se é uma distração ou se é o fluxo da vida te levando.

“Como viver a minha verdade se isso pode causar sofrimento no futuro?” O problema é a sua verdade. A verdade não vai causar problema nenhum, mas a sua verdade pode causar muitos problemas. Você tem razão. Porque a sua verdade tem base em crenças. Compreende o que estou dizendo? Existe a minha verdade, a sua verdade e a verdade. A minha e a sua com certeza lhe trarão problemas. Mas, a verdade jamais lhe trará problemas. A verdade pessoal, ou seja, a verdade do ego tem base nesse medo construído a partir de informações vindas de fora; crenças, preconceitos, conceitos e conhecimento que determinam para você o que está correto. O que eu quero dizer é que você está obstinado a fazer o que é certo. Quem está querendo fazer certo é o eu idealizado, ou seja, é uma construção mental que tem como meta a perfeição. Tem que ser perfeito para poder agradar, para poder ser amado. Então, a espontaneidade autêntica talvez não se encaixe com esses códigos que você carrega. Talvez você desagrade um ou outro. Mas, você quer ser feliz ou quer agradar ao outro. Nesse momento, as duas coisas, eu sei, mas você vai ter que escolher. Esse é o significado da frase que diz que não é possível servir a dois senhores. Você não pode servir a máscara e o seu eu real.

É interessante que se você começa a agir corretamente (neste caso quando falo corretamente, quero dizer a ação correta, aquela que é baseada na intuição e na confiança), essa ação te levará à desconstrução do erro que acabei de falar. Ai pode ressuscitar o medo que já estava morrendo. É nessa hora que você precisa parar, respirar fundo e se recolher no silêncio, ampliando ao máximo a sua percepção, a sua observação, para compreender o que está acontecendo. Você está passando por uma transição; você está experienciando uma mudança. Antes você estava sendo levado pelo medo e agora está começando a se deixar ser levado pela confiança. Você fica lá e cá até que possa se render à confiança, à voz do silêncio que é a intuição, a voz do mestre. Se render ao amor.

Deus tem um plano para você e você já sabia desse plano ao encarnar, mas você se esqueceu e agora está sendo lembrado. É como se estivesse sendo despertado de um encantamento. Você estava encantado com a história do eu idealizado, a história da máscara, da auto-imagem. É um encantamento. Quem é você? Eu sou fulano de tal, eu vivi isso e aquilo… Você conta todo o seu currículo. Esse não é você. Você não é a sua história. Você acredita ser a sua história, o seu nome, mas isso é um encantamento. E você tem medo que o seu cérebro seja lavado. Todo o cristão tem medo de deixar de ser cristão, o judeu tem medo de ser judeu, o hindu tem medo de deixar de ser hindu e assim por diante. Assim como você tem medo de perder o que acredita ser sua identidade. Você tem medo de perder as referências, por isso tem que controlar tudo. “Eu vou nessa direção desde que as coisas aconteçam desse jeito”. Se você age a partir do medo, eu preciso lhe dizer que está condenado a viver uma vida muito sem graça. Isso é matemática. (risos)

Então, meu amado amigo, chegou a hora de você resgatar a aventura de viver, de resgatar o entusiasmo de viver uma vida misteriosa. Para onde você vai? Para onde a vida te levar. Livre assim como a brisa. “Ai que medo!”. Para onde a brisa vai?

 

Abençoado seja cada um de vocês. Receba a benção que te ajuda a seguir o que o coração determina. Até o nosso próximo encontro.

NAMASTÊ!

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