~ OSHO

Guarde em sua memória a melodia que você ouve.

…Somente fragmentos do som magnífico chegam a seus ouvidos enquanto você é apenas um homem. Mas se você o ouvir, recorde-o fielmente, para que nada desse som tenha chegado até você, se perca, e esforce-se para aprender com ele o significado do mistério que circunda você. Com o correr do tempo, você não precisará de nenhum professor. Pois, como o indivíduo tem voz, assim também tem aquilo no qual o indivíduo existe.

 

Guarde em sua memória a melodia que você ouve. Há momentos, raros, únicos, mas, ainda assim, há momentos em que você chega mais perto da melodia da existência. As circunstâncias podem ser diferentes, mas a melodia é a mesma. Uma criança que corre atrás de uma borboleta, uma criança que colhe flores no jardim, uma criança simplesmente deita sobre a grama, sente certa harmonia na existência, sente certa melodia. Nesse momento, deitada sobre a grama, relaxada ou correndo – correndo atrás da borboleta, ou correndo para colher as flores – ou não fazendo nada: apenas brincando com seixos na praia – nesse momento, a criança está totalmente unida à existência. Não há nenhuma tristeza ou pesar, nenhuma negatividade. A criança aceita a existência como ela é e é aceita pela existência.

Quando você aceita a existência, a existência o aceita. Quando você rejeita, você é rejeitado. A existência é um eco do que você faz. Tudo o que fizer com ela será feito com você.

A criança aceita. Para a criança não existe passado, nem futuro. O momento, o momento presente, é suficiente. A criança existe aqui e agora. Então, ela sente uma certa harmonia; uma melodia é sentida.

É por isso que, mais tarde, mesmo quando você fica muito velho, você continua a se recordar de sua infância; vive dizendo que a infância era um paraíso. Por quê? Porque houve muitos momentos nos quais você aceitava tudo totalmente. E uma criança é aceita totalmente. No instante em que a criança começa a rejeitar, deixa de ser criança. A infância é perdida, o paraíso é perdido.

Recorde alguns momentos de sua infância nos quais você teve o sentimento de que a vida era uma bem-aventurança, de que simplesmente ser era um êxtase. Simplesmente ser, respirar, era o bastante. Você não precisava de mais nada para ser feliz. Seja o que for que você fosse, era o suficiente para ser feliz.

Reúna esses momentos. Recorde-os, reviva-os. De vez em quando, esqueça a sua idade. Feche os olhos e retorne, retroceda, seja novamente uma criança. Não se recorde apenas, mas reviva. Seja novamente uma criança. Em sua memória, corra como uma criança, cante como uma criança, brinque como uma criança. Simplesmente reviva novamente sua infância e obterá uma nova luz, um novo despertar. Uma nova energia vital correrá através de você.

Quando você era jovem, amou alguém. Novamente houve êxtase. Outra vez você se sentiu totalmente bem. Nada estava errado. A vida era ótima; tudo era como devia ser. Novamente, um momento. Reúna esses momentos, mantenha-os em seu íntimo. Entre neles repetidas vezes.

Então, você envelheceu – sentado em algum templo, meditando, ou em alguma mesquita, rezando, ou em alguma igreja. E novamente sentiu um silêncio penetrar em você.

Reúna todos esses momentos, porque eles o tornarão mais capaz e mais sensível para ouvir a música sublime das esferas. Eles são apenas fragmentos, mas neles você ouviu algo que está além de você. Seja qual for a circunstância – se uma certa felicidade o invadiu, guarde com carinho esse momento e deixe um espaço para ele em seu coração, livre de todas as outras recordações. Reúna essas recordações da música bem-aventurada que você ouviu algumas vezes; isso será útil.

Você não pode ouvir, repentinamente, a música toda. Pode ouvi-la apenas em fragmentos, porque a mente é uma coisa pequena. O raio de visão da mente é muito pequeno e o céu é muito grande. Você só pode ver fragmentos. Mas reúna esses fragmentos. Crie uma unidade entre eles, sinta uma certa unicidade neles, e você se tornará mais capaz, mais sensível, mais vivo para receber mais. Você se tornará mais receptivo.

Mas olhe para a mente humana. Ela coleciona misérias, coleciona sofrimentos, coleciona amarguras. Jamais coleciona momentos felizes. Vive colecionando miséria após miséria. Então a vida se torna um inferno. Essa é a sua coleção; é o seu modo de olhar para as coisas.

Você sempre diz que a felicidade é apenas momentânea. Mas ninguém diz que o sofrimento é momentâneo, ninguém diz que a angústia é momentânea. Você continua a sentir que a angústia é permanente, que o sofrimento é permanente e que a felicidade é momentânea. Está errado. Angústia e felicidade são similares e equivalentes; são momentâneas.

E, no final das contas, o contrário é verdadeiro. O sofrimento revela-se momentâneo e a bem-aventurança revela-se eterna. Mas, por ora, com essa mente, tudo é momentâneo. O sofrimento vai e vem, a bem-aventurança vem e vai. Mas você continua a colecionar sofrimento, logo, ele parece permanente; você nunca coleciona, nunca trata com carinho, nunca nutre os momentos felizes e alegres, logo, eles dão a impressão de serem momentâneos.

É você quem escolhe assim. Mude a sua escolha – porque, com tanto sofrimento reunido, você acumulará mais sofrimento. O sofrimento aumentará; você está colaborando para que ele aumente. Desse modo, chegará um momento em que você estará tão coberto de sofrimento que não poderá visualizar qualquer possibilidade de bem-aventurança. Então você se tornará totalmente negativo.

Faça exatamente o contrário. Somente isso será de ajuda à sua meditação. Sempre que o sofrimento se manifesta, não o guarde. Deixe-o manifestar-se, mas não o alimente. Para que continuar a falar a seu respeito? Todo mundo vive falando sobre seu sofrimento. Por que enfatizá-lo tanto? Por que dar tanta atenção a ele? Lembre-se de uma das leis: se você der muita atenção a uma coisa, seja o que for, ela crescerá. A atenção é um elemento que ajuda o crescimento. Se você der atenção a qualquer coisa, ela crescerá mais ainda.

Atualmente, os biólogos afirmam que uma criança crescerá mais se for amada porque, através do amor, ela recebe maior atenção. Até mesmo uma planta crescerá mais se o jardineiro lhe der atenção. Se ela for negligenciada, mesmo se tudo o mais for dada a ela – o solo certo, fertilizantes, chuva, luz do Sol, se tudo lhe for dado, exceto atenção consciente – ela levará muito tempo para crescer. Isso é atualmente um fato científico: observado e considerado verdadeiro. Se você amar a planta e lhe der bastante atenção, se conversar com ela, se lhe disser, às vezes: “Eu amo você”, ela crescerá mais depressa. A atenção é uma vitamina.

A coisa mais vital na existência é a atenção. Se ninguém o ama, você começa a murchar. Se ninguém presta atenção em você, a morte se estabelece. Você quer morrer. Se alguém lhe dá atenção, você revive novamente. Atenção é vida, é o “élan” vital.

Se ninguém o amar, você se suicidará, porque não é capaz de amar a si próprio. Se você for capaz de amar a si próprio, se fosse capaz de dar atenção a si próprio, não necessitaria da atenção de ninguém mais. Um Buda pode viver sozinho nesta terra. Você não pode. Se ficar sozinho, suicidar-se-á imediatamente. Você dirá: “Qual é o sentido? Por que devo viver? Quem me amará? A quem amarei?”

A mesma lei se aplica também interiormente, psicologicamente. Se você dá muita atenção ao sofrimento, ajuda-o a crescer. Se dá muita atenção à felicidade, ajuda-a a crescer. Não seja o seu próprio inimigo. Se você se encontra imerso em sofrimento é porque tem dado muita atenção às coisas erradas. Mude o foco da sua atenção. Mesmo se você possui somente uma única lembrança de um instante bem-aventurado, é o suficiente. Dê-lhe atenção e ele crescerá. A semente crescerá e se tornará uma grande árvore. Então você poderá descansar à sua sombra, poderá dançar à sua sombra. Poderá relaxar debaixo dela.

Este sutra diz: Guarde em sua memória a melodia que você ouve. Seja qual for a circunstância em que você tenha ouvido a melodia da vida, em qualquer circunstância. Felicidade significa melodia. Sofrimento significa uma experiência anárquica, uma experiência caótica. Sofrimento significa uma multidão de experiências desconexas: barulho, sem nenhuma música. Felicidade significa música. Nenhum barulho, mas uma harmonia interior; nenhum caos, mas uma unidade interior.

Guarde em sua memória a melodia que você ouve, e então ela crescerá e, um dia, você será capaz de ouvir a música universal em sua totalidade. Então você não precisará de nenhum professor. Não terá de aprender com mais ninguém. Você entrará em contato direto com o divino e nenhum mediador será necessário.

Um professor é um mediador. Você não pode ouvir, e ele pode ouvir. Você não pode ver, e ele pode ver. Você não pode sentir, e ele pode sentir. Ele é necessário somente até o momento em que você mesmo se torna capaz de ouvir, de vez, de se dissolver. Então o professor não tem mais nenhuma utilidade. Você entra em contato direto e imediato com a força universal. Então, você está no próprio rio.

E uma vez que você se tornou capaz de permanecer em bem-aventurança, de permanecer na melodia, uma vez que entrou no rio, então Deus pode conversar com você diretamente.

Lembro-me de uma estória sobre um místico sufi, Bayazid, que permaneceu numa aldeia durante muitos anos. Um dia, os aldeões disseram a Bayazid: “Já faz pelo menos cinco anos que temos estado observando você, e ouvindo você. Você esteve sempre orando e falando com Deus. Agora vemos que você não fala, nem roda mais. Por que essa mudança? Você se tornou um ateu? Perdeu sua crença no divino? Você nunca mais fala, nunca mais ora.”

Bayazid sorriu e disse: “Antes, eu falava e orava. Agora, Deus começou a falar comigo; por isso, devo ficar calado e ouvir. O processo todo se inverteu. Agora, não preciso falar. Agora, ele fala comigo.”

Esse momento chega. Porém, esse momento chega somente quando seu coração está repleto de melodia e um silêncio divino penetra em você. Não há mais barulho. Para onde quer que você olhe, sente a música; para onde quer que você olhe, sente a unidade; para onde quer que você olhe, sente o uno nas diferentes formas. Agora, você tornou-se consciente do mar. As ondas desapareceram para você. Não há mais ondas; apenas o oceano existe. Então, o divino fala diretamente com você.

Não é uma metáfora. A existência fala com você diretamente; não é uma metáfora, não se trata de uma expressão poética. Isso acontece! Mas você precisa estar pronto. E essa prontidão significa um coração repleto de música, um coração repleto de silêncio.

Aprenda com ela a lição da harmonia.

… A própria vida tem sua maneira de falar e nunca se cala. E sua elocução não é, como supõem aqueles que estão surdos, um grito: é uma canção. Aprenda com ela que você faz parte da harmonia; aprenda com ela a obedecer as leis da harmonia.

 

Como você é agora, a vida lhe parece ser um grito. Ela não é. Parece ser um grito porque você está perturbado. A vida é uma canção, mas, para ouvir a canção, você precisa tornar-se uma canção, porque só o semelhante pode compreender o semelhante.

Você é um grito. É por isso que a canção da vida se parece com um grito, com um guincho. É por sua causa. Você a destrói, perturba-a, distorce-a. Quando ela vem até você, vem como uma canção; mas quando ela o atinge, transforma-se num grito, porque você é um grito. Você está doente, está enfermo. Você é fragmentado, não é total. A canção é destruída dentro de você. Torne-se uma canção e então a vida inteira parecerá uma canção. Então não haverá nenhuma negatividade. Quando você é positivo, a vida em sua totalidade torna-se positiva.

É isso o que eu quero dizer por teísta. O teísmo não significa uma crença em Deus, não significa acreditar numa teologia. O teísmo significa um sim total à existência, dizer sim à existência. Mas quando você pode dizer sim? Você só pode dizê-lo quando ouviu a canção. Como você pode dizer sim a um grito; como pode dizer sim a um barulho, um barulho infernal; como pode dizer sim à insanidade que se manifesta por toda parte, à morte, à miséria? Como pode dizer sim a isso? Mas isso ocorre por sua causa, por causa de seus olhos. Seus olhos são um elemento de deformação. É por causa também do coração. Seu coração está repleto de sofrimento, de miséria assim ele não pode encontrar outra coisa. Tudo isso é o seu próprio eco.

Este sutra diz:

Aprenda com ela a lição da harmonia.

Sejam quais forem os belos instantes, sejam quais forem os instantes de êxtase, os instantes felizes que você teve – reúna-os, trate-os com carinho, viva com eles, viva-os. Você se tornará mais sensível à felicidade. A felicidade será mais atraída em sua direção, o amor lhe acontecerá mais intensamente, a meditação lhe chegará mais facilmente. A vida se tornará uma benção; a existência se tornará uma celebração. Porém, você precisa criar um coração feliz.

Então, na experiência fragmentária da bem-aventurança, descubra a característica comum. Uma criança colhendo flores, um jovem amando uma jovem, um velho sentado sob uma árvore, meditando. Todos eles dizem que esse é um momento bem-aventurado – que deve haver algo comum a todos eles. Na periferia, do exterior, parece não haver nada em comum. Uma criança colhendo flores, um jovem amando uma jovem, um velho entoando um mantra. Não parece haver nada em comum entre eles. Mas se todos eles dizem: “Foi um momento bem-aventurado!” – deve haver algo em comum. Descubra esse elemento comum. Descubra o que é que se encontra sempre presente e sem o qual eles não poderiam dizer que todos esses momentos são bem-aventurados.

Talvez o velho negue a existência de algum elemento comum. Ele pode dizer: “Aquele jovem é apenas um tolo. Não há nada nas garotas. Apenas ossos e carne e todas as coisas sujas. Aquele jovem é apenas um tolo. Está desperdiçando o seu tempo.”

Ou o jovem pode dizer: “Aquela criancinha colhendo flores está vivendo num mundo de fantasias. Não é real. Quando ela conhecer mais a vida, jogará fora essas flores. É uma estupidez. Colecionar flores é algo inútil; ela está desperdiçando o seu tempo. É ignorante.”

Mas, ainda assim, deve haver algo em comum a todos eles. Se o velho diz que o jovem é tolo (ou se o jovem diz que a criança é tola), isso significa apenas que a vida, para esse velho, não se tornou ainda uma unidade. Significa apenas que esse velho ainda está revoltado com sua própria infância. Ele não a pôde absorver no curso da vida. Sua juventude não se tornou parte de sua vida. Esse velho está fragmentado, dividido.

Se esse velho fosse realmente não-dividido, se estivesse à procura do elemento comum a todas as experiências, isso seria sabedoria. Encontrar o elemento comum a todas as experiências, o elemento essencial, é sabedoria. Se esse velho chegasse a compreender o que é essencial a todas as experiências bem-aventuradas, veria que quando esteve com uma jovem, amando-a profundamente, aconteceu a mesma coisa que agora acontece em sua meditação. Quando ele, em sua infância, estava colhendo flores no jardim, ou brincando com os seixos à beira-mar, aconteceu a mesma coisa.

Qual é o elemento comum? A atenção, a profunda atenção. A absorção. A criança estava absorta com suas pedras, brincando com elas. A existência toda foi esquecida. A criança esqueceu-se de si mesma. Naquele momento, não existia nada, não existia nenhuma mente. A criança estava totalmente absorta. Devido a essa absorção, a essa anulação total do ego, a bem-aventurança aconteceu. Tornou-se uma meditação.

O jovem estava absorto com sua amada. A existência toda sumiu como se nada mais existisse. Somente a amada existia. Até isso desapareceu: o amante e a amada desapareceram. Apenas o amor existia. Havia um momento que era eterno, um momento que era a própria eternidade. Nenhum passado, nenhum futuro. Agora era tudo. Era uma meditação. O amor é uma meditação. E então a bem-aventurança aconteceu.

Hoje, o velho está cantando sob uma árvore, ou está sentado num templo ouvindo os sinos, e sente-se muito feliz, em êxtase. O que está acontecendo? A mesma coisa está acontecendo numa situação diferente, numa idade diferente, numa experiência diferente. A mesma coisa está acontecendo. O mundo desaparece. O velho não existe mais, o templo desaparece. O momento presente torna-se total. O velho está aqui e agora. Os sinos continuam a tocar. Eles não tocam no futuro; tocam no presente. Nenhuma lembrança do passado interfere, nenhum desejo futuro. O velho está aqui e agora.

Sempre que você está aqui e agora, a bem-aventurança acontece. Como uma criança a brincar com as pedras, como um jovem a brincar com sua amada ou como um velho a brincar com seu canto e com sua meditação. Se todas as três experiências puderem ser sentidas como harmoniosas, você descobriu uma das supremas leis da vida. Você tornou-se sábio. A sabedoria aconteceu a você.

*fonte: http://www.centrometamorfose.com.br/artigos/alquimia_12_licao-harmonia.htm

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